Lisboa, 24 de setembro de 2024 — O Governo português manifestou a sua crescente preocupação com a escassez de água nos municípios mais gravemente afetados pelos incêndios florestais que têm assolado várias regiões do país. As intensas chamas, alimentadas por altas temperaturas e condições de seca severa, têm devastado extensas áreas de floresta, ameaçando também os sistemas de abastecimento de água nas localidades mais atingidas.
Com as consequências do fogo a tornar-se cada vez mais visíveis, surgem agora sérias dúvidas sobre a capacidade de manter o fornecimento de água potável para a população e para os serviços essenciais, como hospitais e quartéis de bombeiros, que enfrentam um cenário de crise prolongada.
Impacto dos incêndios no abastecimento de água
Os incêndios, que se têm intensificado nas últimas semanas, destruíram não só vastas áreas verdes, mas também infraestruturas críticas, incluindo condutas de água e estações de tratamento. A degradação das bacias hidrográficas devido à intensa combustão de florestas está a afetar significativamente a qualidade da água disponível, aumentando o risco de contaminação.
José Manuel Duarte, presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), alertou que “os incêndios estão a comprometer não só a disponibilidade, mas também a qualidade da água nas regiões mais afetadas. Há um risco elevado de contaminação com cinzas e outros resíduos transportados pelas chuvas que inevitavelmente seguirão os fogos.”
Alguns dos municípios mais afetados, como Vila Real, Guarda e Castelo Branco, já relatam dificuldades crescentes em garantir o abastecimento regular de água às populações. A ANMP pediu ao Governo que atue rapidamente, implementando medidas de emergência para assegurar que as necessidades básicas das populações sejam atendidas nas próximas semanas.
Medidas do Governo para mitigar a crise de água
Em resposta, o Governo, através do Ministério do Ambiente e da Ação Climática, anunciou um conjunto de medidas de emergência para apoiar os municípios afetados. O ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, explicou em conferência de imprensa que “estamos a implementar planos de contingência, com destaque para o transporte de água por camiões-cisterna para as localidades que enfrentam maiores dificuldades, assim como a criação de reservatórios temporários.”
As medidas emergenciais incluem:
- Reforço do Transporte de Água: O transporte de água por camiões-cisterna será intensificado nas áreas mais críticas, com o objetivo de garantir o abastecimento a hospitais, centros de saúde e unidades escolares.
- Criação de Reservatórios Temporários: Para facilitar o armazenamento de água nas regiões afetadas, o Governo está a instalar reservatórios temporários em pontos estratégicos, que servirão como fonte de abastecimento temporário até que os sistemas normais possam ser restaurados.
- Monitorização e Tratamento de Água: Estão a ser implementados novos protocolos de monitorização da qualidade da água, com testes mais frequentes para garantir que a água distribuída às populações é segura para consumo. Além disso, as estações de tratamento estão a ser equipadas com tecnologias de filtração adicionais para remover contaminantes introduzidos pelas cinzas.
- Apoio às Populações Deslocadas: Em algumas áreas, as populações afetadas pelos incêndios foram forçadas a abandonar as suas casas. O Governo está a assegurar que estas famílias recebam água potável e outros recursos essenciais nos centros de acolhimento temporário.
- Campanha de Consciencialização Pública: A par das medidas operacionais, o Ministério do Ambiente está a lançar uma campanha de sensibilização para incentivar o uso racional da água, apelando à população para evitar desperdícios e adotar práticas de poupança, especialmente nas zonas mais vulneráveis.
Desafios climáticos e a necessidade de resiliência
A crise provocada pelos incêndios coloca em evidência os desafios crescentes que Portugal enfrenta no contexto das alterações climáticas. As condições de seca prolongada, combinadas com o aumento das temperaturas, têm agravado a frequência e intensidade dos incêndios, colocando uma pressão sem precedentes nos recursos hídricos do país.
Francisco Ferreira, presidente da associação ambientalista ZERO, destacou a urgência de implementar políticas de longo prazo para fortalecer a resiliência dos municípios face a estes desafios. “Os incêndios são uma consequência direta das alterações climáticas e da má gestão florestal. Precisamos de um plano nacional de adaptação às alterações climáticas que inclua a proteção das nossas reservas de água. A curto prazo, as medidas de emergência são cruciais, mas a médio e longo prazo, só conseguiremos lidar com esta crise se investirmos em soluções sustentáveis.”
O Plano Nacional de Gestão da Água, aprovado em 2023, já previa a necessidade de criar infraestruturas resilientes, mas a implementação dessas medidas tem sido lenta. Com a atual crise, há um renovado apelo para acelerar a execução de projetos que possam aumentar a capacidade de retenção de água, como a construção de barragens e a reabilitação de nascentes.
Apoio internacional e cooperação
A nível internacional, Portugal já recebeu ofertas de ajuda de países da União Europeia e de organizações internacionais. A Comissão Europeia ativou o Mecanismo de Proteção Civil, permitindo a Portugal aceder a assistência financeira e logística para lidar com a crise. Equipas de bombeiros e especialistas em gestão de recursos hídricos de Espanha, França e Itália já estão no terreno, colaborando com as autoridades portuguesas.
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, manifestou solidariedade com Portugal e sublinhou a necessidade de reforçar a cooperação europeia no combate aos efeitos das alterações climáticas. “O que está a acontecer em Portugal é um lembrete urgente de que as alterações climáticas são uma ameaça real e presente. Precisamos de uma resposta coordenada a nível europeu para enfrentar estas crises.”
Conclusão
Com os incêndios a devastar vastas áreas do país e a escassez de água a tornar-se uma ameaça iminente, o Governo português está a tomar medidas de emergência para garantir que os municípios afetados possam continuar a fornecer água potável às suas populações. No entanto, a crise expõe a fragilidade dos sistemas de gestão de água do país face às mudanças climáticas, destacando a necessidade urgente de políticas sustentáveis de longo prazo.
A capacidade de Portugal em enfrentar estas crises dependerá não só da eficácia das medidas emergenciais, mas também do investimento em infraestruturas resilientes que possam proteger as populações de eventos climáticos extremos no futuro.