Navio com explosivos destinado a Israel pede retirada de bandeira portuguesa

O navio “Kathrin”, de propriedade alemã e registado na Madeira, que transporta material explosivo com destino a fabricantes de armas em Israel, Polónia e Eslováquia, pediu a retirada da bandeira portuguesa, anunciou fonte oficial à Lusa. Esta decisão surge na sequência de diligências feitas pelo Governo português, que procurou esclarecimentos sobre o caso, conduzindo ao pedido formal e irreversível por parte do armador.

De acordo com a fonte oficial, o armador do navio solicitou na última sexta-feira, de forma irreversível, o cancelamento do registo na Madeira, solicitando a remoção imediata do pavilhão português. “O armador requereu formalmente e de forma irreversível o cancelamento do registo na Madeira, portanto pediu para retirar o pavilhão português”, indicou a fonte. Este pedido ocorreu após vários contatos entre o Governo português e a empresa proprietária da embarcação.

A decisão foi tomada na sequência de pedidos de esclarecimento por parte do Governo português, que estava a acompanhar de perto a situação. Segundo a fonte, o executivo português “esteve sempre em avaliação e em consultas com o armador”, numa tentativa de garantir que o processo fosse conduzido de maneira cuidadosa e discreta, dados os possíveis impactos internacionais envolvidos.

O “Kathrin” é um navio de propriedade alemã, registado em Portugal através do Registo Internacional de Navios da Madeira. A embarcação tem como carga material explosivo, destinado a fabricantes de armamento em vários países, incluindo Israel, Polónia e Eslováquia. Este tipo de transporte tem sido alvo de intensos debates internacionais, particularmente devido ao envolvimento de Israel, num contexto de conflito com o Hamas e a situação de Gaza.

Fontes indicaram que o armador respondeu prontamente às perguntas do Governo português durante o processo, fornecendo informações detalhadas sobre a natureza do material transportado, o que permitiu “atualizar e melhorar” a compreensão do tipo de carga a bordo do navio.

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Com a retirada da bandeira portuguesa, o navio “Kathrin” enfrentará novas restrições. De acordo com as mesmas fontes, o processo de mudança de bandeira deverá durar entre dois a três dias, durante os quais o navio terá de permanecer ao largo e não poderá atracar em nenhum porto até que esteja formalmente registado sob um novo pavilhão. “Não circulará com o pavilhão português. Esta questão acabou”, afirmou a fonte oficial, referindo-se ao facto de que o processo está definitivamente encerrado para Portugal.

O “Kathrin”, que partiu do Vietname, já havia enfrentado restrições durante a sua viagem, tendo sido impedido de atracar em portos na Namíbia e em Angola. Este fato levanta questões sobre o tipo de material transportado e as preocupações de diversos países em relação ao seu conteúdo.

A situação em torno do “Kathrin” atraiu atenção internacional, especialmente após um apelo da relatora especial das Nações Unidas para a Palestina, Francesca Albanese. Na semana passada, Albanese pediu ao Governo português que solicitasse “urgentemente a remoção” da bandeira portuguesa do navio, dada a natureza sensível do material transportado e a sua eventual ligação ao conflito em Gaza.

O apelo da relatora das Nações Unidas baseia-se em considerações legais, com foco nas obrigações dos Estados em relação à transferência de armas para as partes envolvidas em conflitos armados. Albanese referiu que, em janeiro de 2024, o Tribunal Internacional de Justiça (ICJ) reconheceu a plausibilidade de um genocídio em Gaza, destacando que todos os Estados têm a obrigação de “respeitar e fazer respeitar” a Convenção sobre o Genocídio “em todas as circunstâncias”.

Esta questão tornou-se um ponto sensível para Portugal, que teve de lidar com a pressão internacional para evitar ser acusado de cumplicidade em possíveis crimes de guerra. O Bloco de Esquerda já solicitou ao Ministério Público português que investigue e previna qualquer envolvimento do país em atos que possam ser considerados como cooperação com práticas genocidas. O ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, foi também convocado para ser ouvido em outubro na comissão parlamentar de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, a fim de prestar esclarecimentos sobre este caso.

Desde o início do caso, o Governo português tem mantido uma postura discreta nas suas diligências, atuando de maneira a evitar qualquer escândalo diplomático ou possíveis repercussões no plano internacional. Apesar de Portugal não ser responsável pelo conteúdo da carga do “Kathrin”, o facto de o navio estar registado sob bandeira portuguesa implicava responsabilidades legais e morais que o Governo procurou resolver da forma mais cautelosa possível.

A retirada da bandeira portuguesa foi vista como uma solução definitiva para encerrar o envolvimento de Portugal nesta questão sensível, evitando futuros problemas legais ou acusações internacionais que pudessem prejudicar a imagem do país no cenário global.