As autoridades portuguesas tomaram medidas emergenciais para proteger os recursos hídricos das zonas afetadas pelos recentes incêndios florestais. Redes de filtração foram instaladas em vários rios das áreas mais atingidas, com o objetivo de impedir que as cinzas e outros detritos resultantes dos fogos contaminem as captações de água destinadas ao consumo humano. A iniciativa, liderada pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e pela Proteção Civil, faz parte de um plano mais amplo de mitigação dos impactos ambientais após as destruições provocadas pelos incêndios.
A gravidade da situação
Os incêndios florestais deste verão devastaram vastas áreas no centro e norte do país, resultando em uma elevada produção de cinzas e resíduos que agora ameaçam os cursos de água. Com as primeiras chuvas do outono, as autoridades temem que as cinzas sejam arrastadas para os rios e barragens, podendo comprometer a qualidade da água e causar sérios problemas ambientais e de saúde pública.
O presidente da APA, Nuno Lacasta, afirmou que a colocação das redes é uma medida essencial para evitar um desastre ambiental: “As cinzas acumuladas nas áreas queimadas contêm resíduos tóxicos que podem poluir os cursos de água e as captações que abastecem milhões de pessoas. Estas redes servirão como uma barreira física que evitará a entrada de grandes volumes de cinzas nos rios”.
As redes foram instaladas em pontos estratégicos de rios como o Mondego, o Vouga e o Zêzere, regiões particularmente afetadas pelos incêndios. A escolha dos locais teve em conta a proximidade das captações de água para abastecimento público e a sensibilidade ambiental dos ecossistemas aquáticos.
Ação preventiva para evitar a contaminação
A Proteção Civil, em conjunto com os técnicos da APA, tem trabalhado de forma incansável para identificar as áreas de maior risco e implementar medidas de contenção. Além da instalação das redes, estão a ser realizados trabalhos de recuperação de solo e reflorestação em algumas zonas, na tentativa de reduzir a erosão causada pela perda da vegetação.
“Este é um trabalho que exige uma resposta rápida e coordenada, porque o impacto das cinzas nos cursos de água pode ser devastador. Temos uma janela muito curta entre o fim dos incêndios e o início das chuvas de outono para garantir que as cinzas não alcancem os rios em grandes quantidades”, explicou José Luís Carneiro, ministro da Administração Interna, durante uma visita às áreas afetadas.
O ministro destacou ainda que a recuperação total das áreas queimadas levará tempo, mas que o foco principal agora é evitar que a destruição causada pelos incêndios se alastre aos recursos hídricos. “As nossas equipas estão no terreno a trabalhar contra o relógio para proteger o abastecimento de água e a biodiversidade destas regiões”, acrescentou.
Impactos ambientais e riscos para a saúde
A contaminação das águas por cinzas pode ter graves consequências para o meio ambiente e para a saúde pública. As cinzas provenientes dos incêndios contêm partículas finas, metais pesados e compostos orgânicos que, ao serem transportados pela água da chuva, podem chegar aos sistemas de captação e comprometer a qualidade da água potável.
O risco é particularmente elevado em áreas onde a captação de água é feita diretamente dos rios e ribeiras sem um tratamento avançado. “Se essas partículas contaminarem os sistemas de abastecimento, a água pode tornar-se imprópria para consumo humano, além de afetar a vida aquática e os ecossistemas fluviais”, alertou Jorge Mendes, especialista em qualidade da água da Universidade de Coimbra.
A curto prazo, a ingestão de água contaminada por cinzas pode causar problemas de saúde como irritações gastrointestinais e respiratórias, além de potencialmente aumentar os níveis de toxicidade em peixes e outros organismos aquáticos. A longo prazo, a acumulação de metais pesados nos sistemas de água pode gerar complicações mais sérias, tanto para o ambiente quanto para as populações humanas.
Planos de longo prazo e recuperação ambiental
Além das medidas imediatas para conter as cinzas, as autoridades estão a elaborar um plano de ação a longo prazo para restaurar as áreas queimadas e prevenir futuros incêndios. O governo português, em colaboração com as autarquias locais e várias organizações ambientais, está a preparar um programa de reflorestação que visa revitalizar as florestas devastadas, utilizando espécies mais resistentes ao fogo e promovendo a criação de faixas de contenção entre áreas urbanas e zonas florestais.
“A recuperação das florestas e a proteção dos recursos hídricos são duas faces da mesma moeda. Se conseguirmos restaurar a vegetação e promover uma gestão mais sustentável das florestas, vamos reduzir significativamente o risco de incêndios futuros e, ao mesmo tempo, proteger os nossos rios e aquíferos”, afirmou Catarina Martins, diretora da associação ambientalista Quercus.
Os próximos meses serão críticos para a implementação destas medidas. As chuvas de outono e inverno, se forem intensas, podem agravar a situação nas zonas mais afetadas pelos incêndios, causando inundações e maior transporte de cinzas para os rios. No entanto, as autoridades estão otimistas de que as redes de filtração e as ações de reflorestação possam mitigar grande parte dos danos.
O envolvimento da comunidade local
As populações locais também estão a ser envolvidas nos esforços de recuperação, com as autarquias a organizar campanhas de sensibilização para a limpeza e manutenção dos rios e terrenos adjacentes. Voluntários estão a ser mobilizados para ajudar na recolha de detritos e no restabelecimento das margens dos rios, de modo a evitar que os sedimentos e as cinzas sejam arrastados pelas águas.
Em Sernancelhe, uma das localidades afetadas, João Ferreira, presidente da Câmara Municipal, elogiou o espírito de solidariedade da comunidade: “A resposta da população tem sido incrível. Todos entendem a importância de proteger os nossos rios, porque sabem que é da água que dependemos para a agricultura, para o consumo humano e para o turismo, que é uma fonte essencial de rendimento para muitas famílias aqui”.
A colocação de redes de filtração nos rios afetados pelos incêndios representa uma medida crucial para proteger os recursos hídricos de Portugal. Enquanto o país continua a enfrentar os desafios da recuperação pós-incêndios, a cooperação entre autoridades, especialistas e comunidade local é fundamental para garantir que os impactos ambientais sejam minimizados e que a água continue a ser segura para consumo.