Escritor moçambicano Mia Couto “em choque” com “crime contra a nação”

Maputo, Moçambique — O escritor moçambicano Mia Couto manifestou-se profundamente abalado pelos recentes episódios de corrupção e desvios de fundos públicos no país, descrevendo os atos como “um crime contra a nação”. Em declarações feitas na última sexta-feira, durante um evento literário em Maputo, Couto destacou a gravidade dos acontecimentos e lamentou o impacto negativo que a corrupção tem tido sobre a população moçambicana, especialmente os mais vulneráveis.

Reação ao escândalo de corrupção

A fala de Mia Couto veio em um momento de crescente indignação pública, após a revelação de um novo escândalo de corrupção envolvendo figuras de alto escalão do governo e empresários locais. O esquema, que teria desviado milhões de meticais destinados à saúde e educação, tem causado revolta em diversos setores da sociedade. Couto, conhecido por seu ativismo social e político, não hesitou em classificar a situação como uma “traição ao povo” e ressaltou que “o país está sendo lesado por aqueles que deveriam zelar pelo seu bem-estar”.

“É chocante pensar que o futuro de Moçambique está sendo comprometido por interesses pessoais e ganância. O impacto não se reflete apenas nas finanças do Estado, mas também na confiança do povo em suas instituições”, afirmou o escritor, que já recebeu prêmios internacionais por suas obras literárias, sempre enraizadas na realidade moçambicana.

Impacto social e econômico

O desvio de recursos afeta diretamente os setores mais sensíveis da economia, como saúde e educação. Nos últimos meses, hospitais públicos enfrentaram falta de medicamentos e materiais básicos, enquanto escolas nas áreas rurais continuam funcionando sem infraestrutura adequada. Couto enfatizou que esses problemas não são meras consequências de má gestão, mas sim o resultado direto de uma “corrupção sistêmica” que, segundo ele, já atingiu níveis alarmantes.

“Estamos diante de um ciclo vicioso, onde a pobreza gera corrupção, e a corrupção aprofunda a pobreza. É uma equação que, infelizmente, tem sido a realidade de muitos países africanos, e Moçambique não é uma exceção”, observou Couto.

Leia também: O tamanho do mercado global de Eletrônicos Robustos foi de USD 2,30 bilhões em 2023. Este relatório abrange o crescimento do mercado, tendências, oportunidades e previsões para o período de 2024 a 2030.

Cultura de impunidade

Para Mia Couto, um dos maiores problemas enfrentados pelo país é a cultura de impunidade que parece prevalecer entre os responsáveis pelos crimes financeiros. Ele destacou a necessidade urgente de reformar o sistema judiciário para garantir que os culpados sejam responsabilizados e que a justiça seja aplicada de maneira transparente e justa.

“Quando os poderosos roubam, e nada lhes acontece, isso manda uma mensagem perigosa à sociedade: a de que o crime compensa, desde que você esteja no topo. Isso precisa mudar. Precisamos de uma nova ética, de uma nova forma de pensar o serviço público”, afirmou Couto.

Apesar das diversas promessas do governo de combater a corrupção, os esforços têm sido insuficientes. Relatórios recentes de organizações internacionais de monitoramento da corrupção apontam Moçambique como um dos países com maiores índices de corrupção na África Subsaariana. O governo, por sua vez, argumenta que está implementando medidas para reforçar a transparência e a prestação de contas, mas os resultados ainda são limitados.

Repercussão nas redes sociais

As declarações de Mia Couto rapidamente repercutiram nas redes sociais, onde milhares de moçambicanos expressaram apoio às suas palavras. Muitos usuários compartilharam suas próprias experiências com a corrupção no dia a dia, relatando dificuldades para acessar serviços básicos ou obtendo assistência pública devido aos desvios.

“O que Mia Couto disse reflete o que todos nós sentimos. É desolador ver como a corrupção está a destruir o nosso país”, escreveu um internauta no Twitter, enquanto outro comentou: “Precisamos de mais vozes como a de Mia Couto, que falam a verdade e lutam pela justiça”.

A crescente insatisfação popular também se manifesta em manifestações e protestos organizados por movimentos da sociedade civil e organizações não governamentais. Na capital, Maputo, centenas de pessoas tomaram as ruas nas últimas semanas, exigindo maior responsabilidade e transparência por parte dos governantes.

Histórico de ativismo de Mia Couto

Embora amplamente conhecido por seu trabalho literário, Mia Couto sempre esteve profundamente envolvido com as questões sociais e políticas de Moçambique. Ele tem usado sua plataforma para destacar temas como pobreza, desigualdade e injustiça. Em várias ocasiões, ele criticou abertamente políticas governamentais que, em sua opinião, perpetuam a exclusão social e o subdesenvolvimento.

Ao longo dos anos, Couto também se pronunciou sobre a necessidade de reconciliar as tradições africanas com o desenvolvimento moderno, enfatizando a importância de respeitar a diversidade cultural do continente enquanto se busca progresso econômico e social.

“Minha responsabilidade como escritor não é apenas contar histórias, mas também questionar o mundo em que vivemos. A literatura pode ser uma forma poderosa de resistência, e é assim que vejo meu papel neste momento difícil para o nosso país”, afirmou ele em um discurso anterior.

Próximos passos

Apesar da indignação expressa por Mia Couto e outros líderes da sociedade civil, resta saber quais serão os próximos desdobramentos deste caso de corrupção. O governo ainda não anunciou medidas concretas em resposta ao escândalo, e o sistema judicial está sob pressão para agir com celeridade e eficiência.

Enquanto isso, a população continua a esperar por justiça e por uma transformação real nas estruturas de poder que permitiram que tais crimes ocorressem. Mia Couto, por sua vez, promete continuar a usar sua voz para falar em nome daqueles que não têm como se defender.