Bloco de Esquerda Quer Atualizar Prazos da Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG)

Em um esforço para modernizar a legislação sobre a Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG) em Portugal, o Bloco de Esquerda (BE) apresentou uma proposta de atualização dos prazos legais para a realização do procedimento. A proposta, apresentada na Assembleia da República, visa alargar o período permitido para o aborto legal, atualmente limitado a 10 semanas. O objetivo do partido é adaptar a lei às realidades contemporâneas, garantindo às mulheres mais tempo e liberdade para tomar decisões informadas e conscientes.

A Legislação Atual e os Motivos para a Revisão

Desde 2007, a IVG é permitida em Portugal até as 10 semanas de gestação, após um referendo que aprovou a legalização. No entanto, o Bloco de Esquerda argumenta que este prazo já não reflete as necessidades e direitos das mulheres no contexto atual. Segundo o partido, o limite de 10 semanas pode ser insuficiente, principalmente para mulheres que enfrentam dificuldades em obter aconselhamento ou informações de saúde adequadas a tempo.

“A realidade das mulheres mudou, o acesso à saúde mudou, e os tempos em que as mulheres têm que tomar decisões também mudaram. O que queremos é uma lei mais inclusiva e que leve em consideração a autonomia e os direitos das mulheres”, disse Catarina Martins, porta-voz do Bloco de Esquerda, durante a apresentação da proposta.

Proposta de Extensão do Prazo

A proposta do Bloco de Esquerda prevê a extensão do prazo de 10 semanas para 14 semanas. A nova legislação colocaria Portugal em linha com outros países europeus, como a França e a Alemanha, que permitem a IVG até as 12 e 14 semanas, respectivamente.

O BE defende que a extensão do prazo permitirá uma maior margem de manobra para as mulheres que se encontram em situações vulneráveis, especialmente aquelas que enfrentam desafios socioeconômicos, situações de violência doméstica, ou que descobrem a gravidez tardiamente.

“O que vemos na prática é que muitas mulheres não conseguem decidir em tempo útil porque não têm os meios ou apoio necessários”, afirmou Mariana Mortágua, deputada do Bloco de Esquerda. “A lei deve garantir que todas as mulheres tenham tempo e condições para tomar decisões informadas sobre os seus próprios corpos.”

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Reações Políticas e Debate Público

A proposta gerou reações mistas no panorama político. Enquanto o Partido Socialista (PS) expressou abertura para debater o tema, destacando a importância de um debate informado e inclusivo, partidos de direita, como o Partido Social Democrata (PSD) e o CDS-PP, opuseram-se veementemente à ideia de alargar os prazos.

“Estamos a falar de uma questão extremamente sensível. Alterar o prazo legal do aborto vai contra os princípios que muitos cidadãos defendem”, afirmou André Ventura, líder do partido Chega. “A vida deve ser protegida desde a concepção, e estender o prazo só reforça uma cultura de desvalorização da vida.”

Entidades civis e grupos feministas, por outro lado, aplaudiram a proposta do BE. O Movimento pela Interrupção Voluntária da Gravidez Saudável (MIVGS) destacou que a atualização dos prazos está em linha com a evolução das condições de saúde e das novas realidades sociais, que exigem mais flexibilidade e compreensão por parte do Estado.

“Temos que garantir que todas as mulheres, independentemente das suas circunstâncias, tenham o direito de decidir sobre as suas gravidezes sem estarem sujeitas a prazos que não refletem as suas realidades”, disse Sara Gonçalves, porta-voz do MIVGS.

A Situação Internacional

A proposta de atualização dos prazos em Portugal segue uma tendência global de reavaliação das leis sobre aborto. Em 2021, países como a Argentina e o México legalizaram o aborto até 14 semanas, com o objetivo de garantir mais direitos reprodutivos às mulheres. Na Europa, a maioria dos países permite a IVG até 12 semanas, com exceções em casos de risco para a vida da mulher ou em casos de malformações fetais.

De acordo com relatórios da Organização Mundial de Saúde (OMS), a descriminalização e o alargamento dos prazos de aborto estão associados a uma redução significativa de abortos clandestinos e inseguros. A OMS recomenda que os países garantam acesso seguro à IVG, sem barreiras legais ou administrativas que possam colocar em risco a saúde das mulheres.

Impactos Sociais e na Saúde

Especialistas em saúde pública apoiam a proposta de extensão dos prazos, argumentando que dará às mulheres mais tempo para obterem aconselhamento médico, realizar exames pré-natais e tomar decisões informadas. Além disso, estudos indicam que o stress e a pressão psicológica associada ao prazo curto podem ter impactos negativos na saúde mental das mulheres.

Segundo a Associação Portuguesa de Saúde Reprodutiva, a limitação do prazo atual pode levar algumas mulheres a recorrer a métodos inseguros para interromper a gravidez, especialmente em contextos de vulnerabilidade social e económica. O alargamento do prazo contribuiria para reduzir o número de abortos clandestinos e garantir que todas as mulheres tenham acesso a cuidados de saúde seguros.

“O nosso objetivo é garantir que todas as mulheres, independentemente do contexto em que vivem, tenham acesso a serviços de saúde que respeitem a sua dignidade e autonomia”, disse Cláudia Alves, médica especialista em saúde reprodutiva.

Próximos Passos

A proposta do Bloco de Esquerda será debatida nas próximas semanas na Assembleia da República. Caso seja aprovada, a nova legislação poderá entrar em vigor ainda este ano. No entanto, o tema promete ser alvo de intenso debate entre partidos e na sociedade civil.

Organizações religiosas e pró-vida já anunciaram manifestações contra a proposta, enquanto grupos feministas e de direitos humanos preparam campanhas de apoio à mudança da lei. Resta agora ver como o debate político irá evoluir e se a proposta terá o apoio necessário para avançar.